Opinion

Porque é que o governo francês teve de pôr a mão por debaixo da Atos?

Há uma tradição francesa, mesmo em governos liberais, de não deixar afundar as “joias da República”. Agora é a Atos que não pode falhar.

Por Jorge Bento . 11/04/2024

Porque é que o governo francês teve de pôr a mão por debaixo da Atos?

A Atos, o gigante francês de IT, está em apuros e foi bater à porta do governo de Macron. Nacionalizar, como várias vezes aconteceu no passado com as empresas estratégicas francesas, não é mais opção, muito menos para um Presidente liberal como Emmanuel Macron, mas a ideia de o mais importante asset de IT gaulês simplesmente fechar portas é algo para o qual ninguém está preparado no Eliseu.

Sobrecarregada com quase cinco mil milhões de euros em dívida líquida, maioritariamente gerada nos últimos três anos e fruto, em parte, de aquisições estratégicas erradas, a Atos procura desde 2023 um comprador privado europeu com capacidade de injeção de liquidez. Mas os pretendentes têm falhado. O consórcio Airbus foi até ao mês passado o mais desejado parceiro, mas as negociações falharam porque o construtor aeronáutico só pretendia o ramo de cibersegurança e o de bigdata.

São exatamente estas as áreas que fazem tremer os decisores políticos franceses porque a Atos não só assegura a parte mais sensível da Defesa, como seja o arsenal nuclear, como também áreas fundamentais de dados do governo central, ou os Jogos Olímpicos de Paris, entre outros, numa altura em que Macron afirma, sem rodeios, que o país está sob constante ataque cibernético por parte da Rússia.

Também existe um sentimento nacional para que a Atos não falhe, e com ela alguns símbolos da excelência da engenharia francesa, como os supercomputadores Bull. Nesse sentimento geral entre políticos franceses no “toca a reunir” as divergências são como o fazer.

Macron optou por um apoio minimalista e transitório, com um empréstimo direto de 50 milhões de euros e a facilitação de um financiamento comercial de curto prazo de 400 milhões. Basicamente serve para “comprar tempo” e dar à administração da Atos condições para continuar a procura de um comprador, preferencialmente europeu.

O ministro da economia, Bruno Le Maire, exclui a nacionalização, defendida tanto pelas bancadas parlamentares à sua direita, como à sua esquerda, e afirma estar a trabalhar numa solução francesa para o problema. Se falhar, é provável que a Atos se junte à longa histórica lista de empresas francesas que foram nacionalizadas, saneadas com o patrocínio do contribuinte, e voltadas a privatizar. Tudo em nome da independência estratégica nacional. 


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